segunda-feira, 10 de agosto de 2009

A SABOROSA PROSA DE BRILLAT SAVARIN

QUEM?
Jean Anthelme Brillat-Savarin (1755-1826). Advogado, político e escritor francês que ganhou fama como grastrônomo e epicurista. Autor do esplêndido e inesquecível livro A Fisiologia do Gosto.
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COMENTÁRIO
Ler a prosa fina e competente de Brillat Savarin é um deleite. Sim! É dar-se ao desfrute de um texto bem temperado extremamente saboroso, culto e sofisticado. Pois o homem conhecia a fundo o assunto que abordava, o prazer à mesa, e tudo mais que cerca esta nobre e necessária atividade social tão amalgamada à nossa existência. Em sua época, tempo distante de fartura e opulência na província francesa, bem no fim do século XVIII e no início do XIX, surgia, pela primeira vez, os termos gourmets (apreciadores), e gourmands (glutões), que eram exatamente os nomes dados a estes sujeitos privilegiados da nobreza, que tinham, sem dúvida, extremo bom gosto e inclinação aos prazeres gastronômicos, e que se atiravam vorazmente em banquetes e degustações intermináveis, que se sucediam uns aos outros ocupando todo o decorrer de seus dias. Viviam em busca do vinho certo, de uma região específica, dos alimentos nobres e exóticos oriundos de tradições milenares daquelas terras; além de saborearem ávidos as aves, os doces, as trufas; de comerem peixes, moluscos, frutas, caças; de sorverem licores, fermentados e destilados; além, é claro, de devorarem uma miríade de receitas doces e salgadas de forno e fogão.
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Este interessantíssimo autor, com sua pena ágil e leve, utilizando-se do excelente formato Ensaio, trouxe à luz o retrato fiel de um tempo épico de luxo e sofisticação culinária, onde nasceram práticas seguidas até os dias de hoje. Enfim, o cara era do ramo! Entendia e muito do riscado. Marcou época e fez história com seu imperdível livro A Fisiologia do Gosto, do qual foi retirada esta brilhante passagem, que mostra com nitidez sua inclinação pessoal hedonista, além, é claro, de sua prosa fina, inteligente e bem humorada; indicação especial de hoje deste velho Escriba digital pós-tudo.
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CITAÇÃO
"O homem é, incontestavelmente, dos seres sensíveis que povoam nosso globo, o que mais está sujeito ao sofrimento. A natureza o condena inicialmente à dor pela nudez da sua pele, pela forma de seus pés e pelo instinto guerreiro e destrutivo que acompanha a espécie humana onde quer que ela haja sido encontrada.
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Os animais não receberam esta maldição e, fora certos combates causados pelo instinto de reprodução, a dor, no estado natural, seria absolutamente desconhecida pela maioria das espécies, enquanto que o homem, que só sente prazer passageiramente e por intermédio de um pequeno número de órgãos, pode sempre, e por intermédio de todas as partes do seu corpo, ser submetido às dores mais espantosas.
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Esta condição do destino foi agravada, na sua execução, por uma multidão de doenças que resultam dos hábitos e da condição social. Dessa maneira, nem mesmo os prazeres mais vivos e mais bem conduzidos que se possa imaginar podem, seja em intensidade, seja em duração, compensar as dores atrozes que acompanham alguns desarranjos, tais como a gota, a dor de dentes, os reumatismos agudos, a disúria ou os suplícios que são costume em certos povos. É este temor, arraigado na prática, que sente da dor que faz com que o homem, mesmo sem ter consciência disso, se lance no sentido oposto, entregando-se por completo ao pequeno número de prazeres que a natureza lhe concedeu." (pág161)
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LIVRO: "A FISIOLOGIA DO GOSTO" // AUTOR: BRILLAT SAVARIN // EDITORA: SALAMANDRA RIO DE JANEIRO, 1989 // PRIMEIRA EDIÇÃO: 1848

Um comentário:

Anônimo disse...

ótimo trecho do livro que escolheste, caro escriba! Brillat Savarin está, para nós gastrônomos, assim como Júpiter estava para os romanos.

Linkei seu blog ao meu, referenciando o Brillat Savarin!

Abraço e continue escribando

Marcelo

PS: visite http://gastronomio.wordpress.com