quinta-feira, 23 de julho de 2009

A MORTE ATRAVÉS DAS LETRAS SICILIANAS DE LUIGI PIRANDELLO

QUEM?
Luigi Pirandello (1867/1936). Notório dramaturgo, poeta, escritor e romancista siciliano. Seus contos falam da Sicília, da província e refletem a alma bela de seu povo e de sua região. Autor do belíssimo livro Novelas para um Ano - O Velho Deus e do romance O Falecido Mattia Pascal. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura no ano de 1934.
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COMENTÁRIO
A morte fascina e sempre fascinará escritores de todas as gerações. Sim, porque sua eminência inexorável impõe temor mesmo nos menos apegados à vida. Além de que sua irreversibilidade e sua infalibilidade, há milênios comprovadas, provocam no sujeito que reflete sobre ela uma mística fascinação que, sem sombra de dúvida, estimula e dá asas à imaginação. Segundo Sigmund Freud, que se debruçou sobre o assunto como poucos, não podemos sequer conceber o mundo sem considerar a nossa própria existência; ou seja, não conseguimos nem pensar direito nela - na morte - devido ao nosso desmedido e inveterado antropocentrismo umbiguístico. Por estas e por muitas outras razões, a morte exerce atração magnética sobre a alma humana que, diante dela, sempre extremece. Na impossibilidade de compreendê-la plenamente - por razôes óbvias, pois estamos vivos - tratamos logo de dar-lhe cara e contornos quase sempre segundo nosso pobre e mortal imaginário, e fatalmente segundo nossa própria imagem e semelhança.
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Para muitos a morte é poder re-integrar à força plena e natural que um dia nos gerou. Eu concordo e acho também que, além disso, deve ser como um descanso longo, profundo e reconfortante, depois de uma vida atribulada e cheia de incertezas e apurrinhações. Aliás, dizem os entendidos que por lá não existe mais dor, nem paixão, nem remorso, nem nenhuma destas lamentáveis penas que nós comumente arrastamos de lá para cá e daqui para lá nesta vidinha besta e mortal. Todavia, como não há escolhas com relação à esta Nobre Dama que um dia virá nos buscar, tratemos antes de tudo de sermos felizes gozando os dias como se estes nos fossem caríssimos, e também os últimos antes de tão fatídico e mórbido encontro; e, por que não, escrevamos com sabedoria sobre ela! Missão imputável apenas às mentes mais privilegiadas capazes de abstrair suas próprias insignificâncias diante do infinito cósmico do universo.
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Na citaçãos escolhidas, vemos o admirável escritor e dramaturgo Luigi Pirandello numa belíssima reflexão sobre um defunto, passagem esta oriunda do conto Os pensionistas da memória, texto filosófico e meio fantástico, onde este autor nos leva a dar voltas com a idéia irrefutável da morte, e o embaraço que é para os vivos lidar com um cadáver; muito bom!
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Da Redação.
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CITAÇÕES
"Que sorte, a vossa! Acompanhar os mortos ao cemitério e depois voltar para casa, eventualmente com uma grande tristeza na alma e um grande vazio no coração, se o morto vos era querido; e se não, com a satisfação de ter cumprido um dever penoso e querendo dissipar, ao tornar às ocupações e ao corre-corre da vida, a consternação e o abatimento que a idéia e o espetáculo da morte sempre incutem. Todos, de qualquer forma, com uma sensação de alívio, pois mesmo para os parentes mais íntimos, o defunto - sejamos honestos - com aquela gélida e imóvel rigidez impassivelmente oposta a todos os cuidados que lhe prestamos, a todo pranto vertido ao seu redor, é um tremendo estorvo, de que a própria dor - por mais que dê sinais e ainda tente desesperadamente fazer-se pesar - gostaria, no fundo, de se liberar." (pág167)
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"Vamos, vamos! Sabeis, na verdade, por que chorais? Vós chorais por outra razão, meus caros, por uma razão de que não suspeitais nem de longe. Chorais porque o defunto, ele, não pode mais vos dar uma realidade. Dão-vos medo os seus olhos fechados, pois não podem mais ver-vos; aquelas suas mãos duras e gélidas, que não podem mais tocar-vos. Não encontrais paz por causa daquela sua absoluta insensibilidade. Portanto, exatamente poque ele, o defunto, não vos sente mais. O que significa que para vossa ilusão caiu, junto com ele, um apoio, um conforto: a reciprocidade da ilusão." (pág172)
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LIVRO: Dona Mimma - Novelas para um ano // AUTOR: Luigi Pirandello // EDITORA: Berlendis & Vertecchia Editores // São Paulo // 2002

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