sábado, 11 de julho de 2009

JEAN-CHRISTOPHE 1785 PÁGINAS DEPOIS

QUEM?
Romain Rolland (1866/1944). Talentoso novelista, biógrafo e músico francês. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura no ano de 1915. Sua sensível obra concilia o idealismo patriótico com um internacionalismo humanista, além de demonstrar profunda compreensão sobre a alma humana. Escreveu peças de teatro, biografias como a Vida de Beethoven e Mahatma Gandhi, e o espetacular romance Jean-Christophe. Em 1923, fundou a revista Europe. Romain Rolland fez uma importante observação sobre o livro O Futuro de uma Ilusão de Freud. Esta observação foi a premissa usada por Freud para escrever o seguinte livro: O Mal-estar na Civilização. Quando o filósofo político italiano Antonio Gramsci escreveu, na prisão, que o "pessimismo da inteligência" não deveria abalar o "otimismo da vontade", estava citando Romain Rolland.
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ARTIGO
Romain Rolland foi de doer! Clássico e estiloso, profundo e eloquente, enfim, competente e fluido com a pena em punho, pegou-me nas primeiras dez páginas e daí não larguei mais o tal. Foram cinco tijolos de literatura fina, de prosa encadeada e elegante, onde este interessantíssimo autor francês esbanja toda a sua genialidade - sempre guiado e orientado por uma espécie de veracidade plena de si mesma, difícil de explicar - ele vai abstendo-se, com grande habilidade, de cometer excessos de qualquer natureza, e a história vai se impondo e nos cativando à medida que avança suave e sutilmente. Fato é que a obra flui que é uma beleza. Trata-se de uma linda novela! Repleta de emoção, é construída na fragilidade do ser humano, nos recontidos da alma sensível de um músico alemão, que sai pela vida à procura de sua significação, apaixonadamente. Vemos Jean-Christophe. Desde o seu nascimento até sua morte. Uma homem simples, de família de músicos, mas sem grandes posses, com uma alma rebelde e extremamente criativa que vai enfrentando um a um os obstáculos que a vida lhe impõe, sem nunca perder a sua nobreza interior, sua doçura e sensibilidade. O talento do autor em questão se sobressai ainda mais justamente por estas duas características marcantes que atesto aqui: não faz uso de falsos artifícios, de espécie alguma; e suas reflexões são profundas, intensas e notavelmente sensíveis. Eis que um ser humano notável cria uma obra igualmente notável. Que, além de todos os méritos já mencionados, é capaz de prender e cativar o leitor de uma maneira muito singular, transformando sua longa extensão num gozo aprazível e por isso prolongado. Da turma do Sigmund Freud e de outras figurinhas carimbadas de igual quilate, os grandes de seu tempo, Romain Rolland estava atento aos acontecimentos e fenômenos interiores do ser humano, do bicho homem, do Homo sapiens; e as pequenas coisas, os pequenos gestos, os hábitos simples, as paixões que revelam transparentemente o que se passa no interior das almas que habitam estes mesmos corpos - muitas vezes agônicos. Suas paixões e mazelas, suas flores e seus espinhos, seus heróis e seus fantasmas; algo assim, diria eu, com uma ponta de bom humor, bem parecido com a própria realidade. Aliás, Jean-Christophe bem que poderia ter existido. E talvez tenha mesmo, pelo menos na cabeça do talentoso autor resenhado aqui, pois muitas vezes um personagem é apenas uma colagem de muitas pessoas reais condensadas, desconexas, fragmentadas, não importa; o que interessa é que criamos afinidades com este singular alemão meio rústico que se propõe a cruzar a vida sem nunca se desviar de sua inclinação interior de lealdade e justiça, de humanidade e de talento, de sua música e de sua fé, e, especialmente, de sua maior virtude: a bondade. Com toda certeza um rebelde, um bom rebelde, de todo o modo útil à humanidade, talentoso e cheio de energia, à frente, muito à frente de seu tempo e de sua conservadora cultura germânica, um amante da natureza, enfim, um homem bom.
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No mais, este romance reflete um tempo de outrora, uma época passada, uma determinada cultura muito sofisticada e crítica, muito rica e muito profícua nas artes e na música de uma maneira geral, onde velhos valores eram postos toda a hora à prova - assim como Jean-Christophe faz sempre na história - de homens notáveis assim como ele, que tinham que confrontar estes limites e transpô-los, para o bom fluir desta tão bela arte que é a música erudita, e para o avançar saudável dos dias e dos homens de sua geração.
É claro que o romance Jean-Christophe é uma recomendação mais do que especial deste escriba velho, e que afirmo categoricamente que os que puderem ter a oportunidade ler a referida obra inteira - e tempo, que sem dúvida é necessário - com certeza, não se arrependerão de fazê-lo.
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Ademais, que a leitura seja sempre útil àquele que lê, trazendo, se possível, bons fluidos e bons algúrios para o mesmo. Para achar os referidos livros por um bom preço, convêm recorrer aos sebos. A minha edição, por exempolo, de capa dura e em ótimo estado, adquiri em São Paulo, no sebo de um amigo à Av. Brigadeiro, por um preço muito bom. Um terço do preço das livrarias. Axé!
Da Redação.
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LIVRO: Jean-Christophe // AUTOR: Romain Rolland // EDITORA: Globo // São Paulo // 1941

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