quinta-feira, 16 de abril de 2009

O FALECIDO MATTIA PASCAL DE PIRANDELLO

QUEM?
Luigi Pirandello (1867/1936). Notório dramaturgo, poeta, escritor e romancista siciliano. Seus contos falam da Sicília, da província, e refletem a alma bela de seu povo e de sua região. Autor do belíssimo livro, Novelas para um Ano - O Velho Deus, e do romance O Falecido Mattia Pascal . Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura no ano de 1934.
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COMENTÁRIO
O belo romance O Falecido Mattia Pascal de Luigi Pirandello é, sem sombra de dúvida, uma obra brilhante e honesta. Honesta sim, porque o autor em questão, talentoso que era, não se utilizava de alguns artifícios muito comuns praticados pelos vulgos escrivinhadores mundo afora, quando estes querem conferir emoção e dignidade a algo que, na verdade, é raso e vazio. Pessoas belas, ricas, predestinadas, que agem em prol de uma causa nobre... castelos, princesas, violência e até mesmo sexo... Nada disso há em Mattia Pascal! E não se sente falta! Tudo, na inteligentíssima trama, acontece como o é na vida real, meio que aleatoriamente. O personagem principal e caolho, feio, pobre e passa por bons bocados, quando alguém morre em seu lugar, e tudo em sua vida vira de pernas para o ar. As mulheres? Normais, são belas, mas de uma beleza mais íntima e sublime, da simplicidade das almas ternas, menos afeitas à estética, e mais à humanidade, enfim, trata-se de uma sensacional estória, construída à partir de uma nota de jornal, ou seja, inspirada em fatos reais, no mínimo curiosos. Há, é verdade, uma ida básica a um cassino, e um ganho inesperado que faz o personagem principal preterir às coisas materiais, mas, até isso, é perdoável, já que a árdua batalha travada nesta novela, tem como terreno e palco o campo das idéias, e não o das matérias, tão frágeis e corruptíveis. Com efeito, é muito interessante, a profunda reflexão filosófica, que este inteligentíssimo autor siciliano nos propõe, ele, que é formado na matéria pela Universidade de Bonn, na Alemanha, e que sabe como ninguém, levantar questões importantes e pertinentes, que dizem respeito ao fato de estarmos vivos, e todas as implicações oriundas desta condição. Dentro deste mundo obscuro, encoberto pelo manto negro das aparências, que tudo encobre e oculta, trava-se uma batalha no interior da alma do próprio Mattia Pascal que, dado como morto, se vê diante de acontecimentos, que são capazes de modificar drásticamente o seu, como direi, acoplamento estrutural, no âmago da sociedade e do tempo em que vive. Algo fabuloso, como se pudessemos nos despregar da enorme e monumental teia social que nos envolve, deixando-nos livres, sem passado, sem parentes, como que para recomeçar uma outra vida, em uma nova identidade, todavia, é justamente aí, que seu problemas começam, pois, viver, é infalivelmente, estarmos emaranhados em nossas famílias, conhecidos e em nossa estória pessoal e, muitas vezes, esta falta de laços, acaba sendo um problema maior ainda que o inicial. No caso dele, dívidas, parentes, e situação familiar indesejáveis. Assim, com bom gosto e afabilidade, com um humor inteligente e crítico, sem recorrer à guerra, nem ao fogo amigo das paixões incendiárias, e nem tão pouco lançar mão de tintas como o sangue humano, a bela e honesta estória de Mattia Pascal se desenrola com muita desenvoltura, preterindo sempre às coisas menores e inferiores, e privilegiando sempre o espírito, a sensibilidade e a alma humana. Estória interessantíssima, com final surpreendente, que nos obriga docemente a pensar e repensar o que significa finalmente viver. Recomendação especial deste velho Escriba Digital. O que não é a modernidade!
Na citação, especificamente, vemos uma passagem de extrema tensão, que se dá entre a esposa e os seus dois maridos: o atual, e o falecido.
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CITAÇÃO
"Ao oferecer-me a xícara, olhou para mim, tendo nos lábios um leve, triste sorriso, quase distante, e disse:
- Você, como de costume, sem açúcar, nãoé?
O que foi que ela leu, nesser instante, nos meus olhos? Baixou imediatamente os dela.
Na lívida luz da alvorada, senti um inesperado nó de pranto apertar-me a garganta e olhei para Pomino com ódio. Mas o café fumegava debaixo do meu nariz, inebriando-me com seu aroma, e comecei a sorvê-o lentamente."
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LIVRO: O Falecido Mattia Pascal - Seis Personagens a Procura de um Autor // AUTOR: Luigi Pirandello // EDITORA: Abril Cultural // São Paulo // 1981

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